"Eu prefiro ser um otimista e estar errado do que ser um pessimista e estar certo"
Albert Einstein

domingo, 18 de setembro de 2011

Texto Complementar - A Grande Guerra (1914-18)

Amigos,

Publico um texto que escrevi sobre a Grande Guerra (1914-1918). Assim os Imperialismos e a questão dos Balcãs serão melhor compreendidas, pois não é uma matéria fácil.

Abraços

Luiz


A Grande Guerra (1914-18)


“(...) Mais uma guerra sem razão
Já são tantas as crianças com armas na mão
Mas eles explicam que a guerra gera empregos
E aumenta a produção

Uma guerra sempre avança a tecnologia
Mesmo sendo guerra santa
Quente, morna ou fria
Pra que exportar comida?
Se as armas dão mais lucros na exportação (...)”
Trecho da música “Canção do Senhor da Guerra”, da Legião Urbana

A Guerra Total

O que é a guerra?
A guerra é o momento da humanidade em que não há humanidade. Nenhuma lei civil ou moral existe numa guerra. A guerra é o apogeu da irracionalidade humana, uma vez que a mulher que seus compatriotas estão violentando podia ser sua mãe, caso você tivesse nascido do outro lado da fronteira.
O que as guerras modernas possuem de novidade em relação às guerras anteriores?
O aumento da capacidade bélica e destrutiva é visível, mas não é a única coisa. A guerra moderna possui objetivos diferentes. Enquanto nas guerras anteriores havia uma disputa política e territorial entre Reis, de forma que quanto maior fosse o meu território, maior seria o meu poder e status (esse pensamento é típico de uma cultura, como a européia, na qual o símbolo de poder durante séculos foi a terra) agora dá lugar a uma guerra de competição econômica. A guerra total é uma guerra capitalista.


Como base do Capitalismo, temos alguns mecanismos importantes, como a lei de oferta e procura, e a competitividade, sendo esta última beneficiária ao consumidor, uma vez que “a concorrência é a alma do negócio”. Com a guerra moderna, o Capitalismo mostra sua face mais assustadora, na qual a competição pacífica dá lugar à agressão, e os consumidores se tornam recrutas. Na guerra total, ganha aquele que tiver uma capacidade industrial maior de produzir mais e abastecer a máquina de guerra na frente de batalha.
É por isso que as mortes nas guerras atuais não são majoritariamente nos campos de batalha, e sim nas cidades que  muitas vezes estão longe do front, e isso não ocorria nas guerras anteriores ao século XX. O cidadão comum, trabalhador, é uma engrenagem da máquina de guerra que precisa ser sabotada. Não basta apenas vencer batalhas, mas sim arruinar a economia concorrente, e nenhuma economia no mundo cresce sem mão-de-obra, e sem consumidores.
Junto à face tenebrosa do mundo capitalista, temos ainda o alicerce ideológico que motiva as massas a apoiarem o massacre, como se uma criança morta do outro lado da fronteira fosse na verdade de outro mundo. O Nacionalismo, o amor exacerbado pela pátria, pelos seus símbolos, pelo seu poder (que não se media somente pelo tamanho do território, o “espaço vital” da nação, mas também pela produção econômica) alimentou por um lado o sentimento de pertencer a algo comum (somos brasileiros, isso nos torna semelhantes), porém nos diferenciando de outros (não somos argentinos, bolivianos ou colombianos). A idéia de nação ou de nacionalidade, tendo em seu seio a igualdade sonhada pelo Iluminismo, foi deturpada pelas sociedades modernas, na medida em que serve de desculpa para o governantes convencerem a opinião pública de seus países que a guerra é necessária para a defesa dos interesses da nação. Bush justifica a guerra no Iraque de que forma?
O Nacionalismo potencializa a violência da guerra, pois abre o leque de alvos primários: o alvo não é mais o homem adulto com idade para produzir e lutar; mulheres, velhos e crianças também são alvos nas guerras de hoje, graças ao nacionalismo exagerado que acaba promovendo o ódio ao estrangeiro, a xenofobia.
Nó século XIX, a guerra mais violenta do mundo pós-napoleônico deve ter sido a guerra Prússia-Alemanha contra a França, no contexto da unificação alemã (1870-71), matando cerca de 150 mil pessoas. A Primeira Guerra Mundial matou ao menos cerca de 9 milhões de pessoas, sem contar os 40 milhões de feridos. A Segunda Guerra Mundial bateu recorde de selvageria e ficou com a medalha de ouro: cerca de 50 milhões de mortos, fora os 30 milhões de mutilados. Não se iludam: esses números não traduzem meras inovações tecnológicas, e sim uma realidade brutal.

O caminho das pedras da Grande Guerra

As disputas imperialistas entre as potências européias no século XIX, por uma redefinição do equilíbrio de poder no mundo, não chegaram a um consenso pacífico. A Grande Guerra é o seu epílogo, sua conseqüência mais direta.
Para melhor entendermos a formação das alianças militares, é necessário entender os motivos das rivalidades entre as potências:

Alemanha x Inglaterra: Após a unificação, a Alemanha deu grande impulso industrial em sua economia, passando a competir diretamente com a Inglaterra por matéria-prima barata e mercados consumidores. Na virada para o século XX, a Alemanha já havia superado a Inglaterra em produção industrial, se tornando a maior potência econômica da Europa.
A disputa por domínios na África e na Ásia, além da competição econômica, acirravam os ânimos entre ingleses e alemães.

Alemanha x França: O processo de unificação da Alemanha incluiu também um conflito contra a França, que não queria ver o país vizinho fortalecido. Os franceses perderam, e foram obrigados, em pleno Palácio de Versalhes, a assinar o Tratado de Frankfurt, no qual entregava a rica região mineradora de Alsácia-Lorena aos alemães, além de pagar uma pesada dívida de guerra. Como se não bastasse, o Imperador do Reich alemão, Guilherme, foi coroado nessa ocasião.
A humilhação sofrida neste episódio gerou um forte ressentimento nos franceses (alimentado, obviamente, pelo orgulho nacional ferido). A França sonhava com a revanche.

Alemanha x Rússia/Inglaterra: A Alemanha, através de um acordo com o Império Turco-Otomano, planejava construir uma ferrovia ligando Berlim à Bagdá, no Oriente Médio. O ouro negro, o petróleo, já saltava os olhos das potências industriais, e o Oriente Médio se torna seu foco. O problema é que a Rússia tinha pretensões de anexação territorial no meio deste caminho, como a Península Balcânica e o o próprio Império Otomano, e caso a ferrovia se concretizasse, seu sonho de obter saída para um mar quente levaria um banho de água fria. Quanto à Inglaterra, a ferrovia Berlim-Bagdá iria tornar a economia alemã ainda mais competitiva, pois daria aos alemães fontes de energia para a indústria.

Império Austro-Húngaro x Rússia: A anexação da Bósnia-Herzegovina pelo Império Austro-Húngaro, nos Balcãs, em 1908, acirrou ainda mais a rivalidade deste país com a Rússia. Os russos sonhavam obter uma saída para mar quente pela região balcânica, e para isso utilizava o discurso do pan-eslavismo (união dos povos eslavos) dos quais a maioria dos russos eram descendentes, tentando dessa forma se aproximar dos também eslavos da Península Balcânica. Para isso, apoiava a Sérvia, um país eslavo da região que queria anexar toda a região e formar um grande país, a Grande Sérvia. A invasão austríaca na Bósnia atacou diretamente os planos sérvios. Além da questão balcânica, o pan-eslavismo atacava o próprio Império Austro-Húngaro, uma vez que este império possuía vários povos diferentes dentro de suas fronteiras, entre eles os eslavos.

A combinação de interesses e rivalidades geraram a formação de alianças. Já em 1882, a Alemanha, Itália e Império Austro-Húngaro formaram a Tríplice Aliança. Sua data, bem anterior a guerra, demonstra como ocorreu uma efetiva corrida armamentista no período, uma vez que mais trinta anos antes do início do conflito, esta aliança foi formada.
A Alemanha sendo inimiga comum à França e à Inglaterra, acabou provocando uma aproximação entre dois países até então rivais na corrida imperialista. Em 1904, foi assinado uma série de tratados que iriam compor a Entente Cordiale (Acordo Cordial em francês), no qual franceses e ingleses buscavam uma aliança mútua. Em 1907, a Rússia também se insere na aliança, formando a Tríplice Entente.



O início do conflito

28 de julho de 1914. O manezão herdeiro do trono austríaco, Francisco Ferdinando, passeia em carro aberto nas ruas de Sarajevo, capital da Bósnia-Herzegovina. Conseguem imaginar o Bush andando em carro aberto no Iraque? Um militante sérvio aproveita o mole e larga o dedo no príncipe. Esse é o estopim da guerra.
O mais importante é percebermos que o que causou a guerra não foi a morte de Francisco Ferdinando. Já havia uma corrida armamentista, já havia uma propaganda pública nacionalista nos países para o apoio à guerra em defesa da nação. A morte de Francisco Ferdinando só acendeu o pavio, a bomba já estava armada.
Os austríacos exigem que a Sérvia investigue a morte do príncipe austríaco, e os sérvios não aceitam essa imposição. A Rússia já estava mobilizando tropas, enquanto a Alemanha cobrava neutralidade da França no conflito. Tarde demais, pois a política de alianças gerou um efeito-dominó, arrastando os países das duas alianças para o conflito.

A Grande Guerra (1914-18)

A guerra pode ser dividida em três momentos. No primeiro, em 1914, caracterizou-se por uma ofensiva rápida alemã na frente oriental, contra os russos, e a invasão da Bélgica para poder atacar a França pelo norte. A intenção alemã  era que a vitória fosse rápida. Ninguém, de nenhum país, acreditava que a guerra ia se arrastar por quatro anos.
Em um segundo momento, entre 1915-1916, a guerra assume um caráter de equilíbrio, do qual as trincheiras são o melhor exemplo. A guerra de trincheiras, disputando pedaço a pedaço do território, mostrou-se catastrófica para a sobrevivência das tropas, uma vez que era comum a convivência com ratos e outros animais nojentos, aumentando com isso a mortalidade da guerra com doenças.
A Itália, neutra na guerra até o momento, vira a casaca e pula para o lado da Tríplice Entente, iludida com vantagens territoriais prometidas pelos ingleses e franceses, em troca de seu apoio.
É neste período que a face da guerra moderna mostra sua cara mais sombria: tanques,  submarinos, aviões e armas químicas são utilizadas em conflito. Os aviões, inicialmente usados pelos franceses, ainda não tinham adaptações para armas e bombas, sendo os ataques feitos manualmente por um soldado, enquanto o outro pilotava. Porém, sua importância garantia maior visibilidade estratégica dos campos de batalha. O gás mostarda, usado pelos alemães, dava um pequeno “estímulo” para os franceses saírem das trincheiras, uma vez que esse gás provoca queimaduras no sistema respiratório. Os tanques, utilizado primeiro pelos ingleses, aumentavam o poder de fogo, mas não protegiam muito as tropas, uma vez que logo foi desenvolvida a artilharia anti-tanque. Quanto ao submarino, este servia não só para afundar os navios de guerra inimigos, como também torpedear os navios mercantes, sendo um dos objetivos da guerra submarina matar o inimigo de fome (uma espécie de Bloqueio Continental mais moderno).
Apesar do relativo equilíbrio da guerra, a Alemanha estava ligeiramente ganhando a mesma. Mas em 1917 as coisas mudariam.
O terceiro e último momento da Grande Guerra, entre 1917 e 1918, caracteriza pela saída da Rússia do conflito, devido à Revolução Russa, e a entrada dos EUA na guerra, ao lado da Tríplice Entente. Até então neutros, olhando a guerra como um conflito entre europeus, os americanos resolvem mudar de idéia quando a Tríplice Entente ameaça ser derrotada. Muitos empréstimos e apoio financeiro tinha sido dado pelos EUA a esses países, e se eles perdessem, não arcariam com seus compromissos.  Então, eis o grande salvador do mundo, da democracia e da liberdade, entrando no conflito em pleno vapor, enquanto a Alemanha e o Império Austro-Húngaro já estavam esgotados pelo esforço de guerra. A entrada dos EUA no conflito definiu a guerra para o lado da Entente. Em 11 de novembro de 1918, é assinado o armistício.



Consequências


Em 1919 foi imposta à Alemanha, no dia 28 de junho, o Tratado de Versalhes. 


Tratado de Versalhes 
Ficou estabelecido no Tratado de Versalhes que a Alemanha deveria cumprir as seguintes propostas: 

• Devolver a Alsácia e a Lorena à França. 
• Ceder minas de carvão do Sarre à França num prazo de 15 anos. 
• Entregar suas colônias, submarinos e navios à Inglaterra, França e Bélgica. 
• Pagar aos vencedores a bagatela de 33 milhões de dólares. 
• Reduzir armamentos, não possuir força aérea, não fabricar armas e não ter um exército superior a 100 mil homens.


A paz punitiva de Versalhes pode ser considerada uma das principais causas do surgimento do fascismo, o qual acabaria deflagrando a Segunda Guerra Mundial.
Como conseqüência da Grande Guerra, temos o declínio do continente europeu na hegemonia do mundo e ascensão dos EUA como potência mundial.
A Grande Guerra, apesar de ter sido travada basicamente na Europa, pode ser considerada de proporções mundiais, primeiro pela sua mobilização, com vários outros países sendo arrastados para o conflito (o Brasil também vai pra guerra, mas com efetivo de médicos e enfermeiros, ao lado da Tríplice Entente). Além disso, as conseqüências desse conflito europeu assumiu escala mundial.

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